O templo onde eu ainda não vivia



Num tempo anterior ao tempo
em que o eco meu ainda não vivia
e o espelho ainda não era invento
mas já nascera a lua e o astro do dia
vivia um mago que falava com o vento
num templo que ainda nem era templo
do tempo barbeiro que aí viria... 


Jorge Santos

Ela ia e ele vinha



Ela ia e ele vinha,
Olhavam-se e sorriam,
Ele ia e ela vinha,
Como que se perseguiam,

Isto duas vezes por dia,
Ela ia e ele vinha,
Ele vinha e ela ia,
De tarde e de manhãzinha,

Nos olhos fundos traziam,
O nascer e o pôr-do-sol,
Pareciam velas que acendiam,
Na manhã e de tarde apagavam.

Ela ia e ele vinha,
Ele vinha e ela ia,
Até que um dia,
(Bem à tardinha),

Unem-se num longo beijo,
E daí prá frente,
Ele ia e ela ia,
Ela vinha e ele vinha,

E foi assim sempre, até que a morte,
Veio, de mansinho,
E levou, primeiro um,
E depois, o outro,

Ele não veio... mais,
E ela também... não mais veio.

(mas continuaram os filhos e netos
Sorrindo e percorrendo os mesmos caminhos )

Jorge Santos (16/11/2010)

Solidão



A solidão
Infiltra-se-me nas veias
Como emigrante ilegal,
Possuo-a no recanto das narinas e
Não apenas no instinto
E prevejo-a na saudade,
No tom da voz suave, que não me pertence,
E no suposto sonho, que não venço,
(Talvez por ser eu tão pequeno
E violento o meu abraço)
Mas dou o nada por tudo,
E a marcar o rumo de minh'alma
Sem fundo, há um sólido prisma
Negro,negro preso a um recado,
(saudade do que não sou)
Que mais parece pleonasmo,
Quando distorce o brado
Da palavra que amo
E me engasga se a mordo
(solidão)





Jorge Santos (11/2010)