Dó,Ré,Mi...



Ut queant laxis,
Resonare fibris,
Mira gestorum,
Famuli tuorum,
Solve polluti,
Labii reatum.
Sancte Ioannes



"Para que os teus servos possam cantar as maravilhas dos Teus Actos admiráveis, absolve as faltas dos seus lábios impuros".

Tu (Do) maravilhas em actos, deixando
Rezar teus filhos, fazendo
Milagres e de teus gestos
Fazendo leis e nas faltas
Solvendo a pureza que no
Lábio destes reste,tudo em nome de-
Santo Ioanes
Jorge Santos (12/2010)
http://namastibet.blogspot.com


Há-de-vento



Há-de vento
O que há-de calmaria,
Há-de noite
O mesmo que há-de dia
Há-da treva usurpar a luz do'dia...


Jorge Santos (12/2010)

Altos Vão....





Os nossos corações vão altos...sem quem os alcance
E caem em cacos...como se louça fosse...

Jorge santos 

Dane-se



Dane-se o sonho, dane-se o dia
 Se há-de vento o que há-de calmaria
Há-de noite o mesmo que há-de dia
De noite os meus olhos são palcos do que imagino
De dia Iludo-os com aplausos
E fechos eclair p’ra não entrar a luz da rua
E a gritaria  

Jorge santos

O templo onde eu ainda não vivia



Num tempo anterior ao tempo
em que o eco meu ainda não vivia
e o espelho ainda não era invento
mas já nascera a lua e o astro do dia
vivia um mago que falava com o vento
num templo que ainda nem era templo
do tempo barbeiro que aí viria... 


Jorge Santos

Ela ia e ele vinha



Ela ia e ele vinha,
Olhavam-se e sorriam,
Ele ia e ela vinha,
Como que se perseguiam,

Isto duas vezes por dia,
Ela ia e ele vinha,
Ele vinha e ela ia,
De tarde e de manhãzinha,

Nos olhos fundos traziam,
O nascer e o pôr-do-sol,
Pareciam velas que acendiam,
Na manhã e de tarde apagavam.

Ela ia e ele vinha,
Ele vinha e ela ia,
Até que um dia,
(Bem à tardinha),

Unem-se num longo beijo,
E daí prá frente,
Ele ia e ela ia,
Ela vinha e ele vinha,

E foi assim sempre, até que a morte,
Veio, de mansinho,
E levou, primeiro um,
E depois, o outro,

Ele não veio... mais,
E ela também... não mais veio.

(mas continuaram os filhos e netos
Sorrindo e percorrendo os mesmos caminhos )

Jorge Santos (16/11/2010)

Solidão



A solidão
Infiltra-se-me nas veias
Como emigrante ilegal,
Possuo-a no recanto das narinas e
Não apenas no instinto
E prevejo-a na saudade,
No tom da voz suave, que não me pertence,
E no suposto sonho, que não venço,
(Talvez por ser eu tão pequeno
E violento o meu abraço)
Mas dou o nada por tudo,
E a marcar o rumo de minh'alma
Sem fundo, há um sólido prisma
Negro,negro preso a um recado,
(saudade do que não sou)
Que mais parece pleonasmo,
Quando distorce o brado
Da palavra que amo
E me engasga se a mordo
(solidão)





Jorge Santos (11/2010)

Roxxanne...







Roxxanne brotou alterada, sem voz de pata ou gansa, Alaranjada ao invés de tutti-color , como gansa da quinta do parnaíso , da dita dimensão que se preze,de pescoço alevantado, longas plumas laranja e penachos verdeosos. Tomou-se logo de manifestas e imediatas ostentações depois de se mirar, breve no lago, pela primeira vez . No galináceo arrabalde, levantou-se longo e lesto burburinho, eram tantos os aplausos e ovações com que as outras lhe prendavam a vaidade que bella Roxxanne tomou essa magnificência como verdade absoluta e magistral.


Foi num fim de tarde, um por sol de igual grandeza Cobiçou e desde logo namorou daí, do poleiro, (ela ambicionou plágiar o brilho solar). Desfez-se Sol em claridade solestícia em longes e alturas de multicores nos céus do arco-íris orquestrando minuetes e tons de édens celestais.

Bella Roxxanne inflamou-se, os penachos laranja tintaram-se ,solarizaram-se e radiaram tal brilho que toda a capoeira saiu em alvoroço.Foi o suficiente para queimar as penas que a cobriam ; ficou sem pena alguma, tapada por uma pele burbulhenta e cachuchos , inchada até à ponta do bico que mais parecia um pato-bravo e mudo.

Fugiu dali espavorida, perante o susto, toda a quinta do parnaíso ficou escarapantada.

Não conseguindo encarar a luz de frente esconde-se entre a folhagem de uma grande Magnólia de folha caduca em Shang-ri-la, tinha–se transformado em filha bastarda do sol, os raios que outrora lhe davam vida açoitam agora a pele nua.

Como sabem, shang-ri-la é um reino laranjado em terras de laranjais e perto do território das nogueiras e dos Azeites na Provinciana Sadina.

Caiu a noite e disse-lhe a lua ,já cheia da melancolia da ave nua:

-Todas as flores já choram ,vês aquela rosa amarela encharcada em lágrimas ? Até eu já estou branca e baça de triste.

Vê... Roxxanne , como brilham as estrelas, algumas mais que umas outras, destas ,várias foram gigantes e agora não passam de anãs brancas ,todos nós tivemos oportunidade de brilhar pelo menos uma vez na vida ,temos de aproveitar ,como tu ; usar esse brilho, sim, mas fazê-lo durar o mais possível, como um archote na noite,  quando este se apaga cedo demais podemos ficar às escuras e perdidos , sem luar, tens de felicitar-te por teres brilhado ,muitos nunca o fizeram com medo de se exporem, amanhã , outro galináceo será premiado com elogios e também pensará igualar o sol , eu , por meu lado , sou apenas um espelho ,nunca pensei , em ser mais brilhante que ele, contento-me com isso, mas tu ; tu és uma ave magnifica , porque sonhaste o sol.

Todos nós somos filhos do universo e de uma verdade inconciliável ,O Caos,  pó das estrelas somos  , já todos ardemos em fornalhas como o sol ,até eu própria  e lançados no espaço , como filhos  e viajando , para SEMPRE Nele.

Mais serena e confiante , a ave do Parnaíso , cantou pela primeira vez e a mais bela canção  alguma vez ouvida, viveu feliz em chang-ri-la ou em qualquer outra história dos Homens



JORGE SANTOS (2008)

Núria's Ring



Como descrer das fabulosas noites
A destapar céus, vestidos negros
Cravados a buracos de alfinetes
Sem neles mesmo admitir prodígios!?





Nuria’s ring


Reza a historia ,que no reino de Devon aconteciam estranhos encantos, vivia na floresta de Dartmoor , na mais recôndita clareira ,numa simples cabana, uma feiticeira, Núria ,cujos encantamentos , soprados de ouvido em ouvido eram sobejamente conhecidos , todos os gentios sob o domínio do soberano Conde lord Wellington ,apelavam a Núria para conseguirem sobreviver , O Conde era um homem insolentemente rico e gordo devido aos impostos cobrados aos vilões e gentes do condado.

O medo reinava em Devon, empobrecidos e tristes d’alma solicitavam a Núria , a feiticeira que , com o poder de um único dedo enfeitado com um grande anel de cristalinos diamantes afastasse o triste fadar dos rostos desta pobre gente, quando regressavam às aldeias vinham felizes,traziam sacos com comidas e nas bolsas algumas moedas de ouro,sabiam que não poderiam arrecadar muito ouro e riquezas sob pena de não conseguir regressar à floresta com o coração puro e não poderem mais admirar os encantos feitiçados da liberdade.

A floresta coriscava de brilhos, aos seus olhos encantada,ali pendiam das árvores lianas em ouro,ali havia esmeraldas nos ribeiros,cascatas de prata ,as gotas de água cintilavam de diamantes, topázios e até os céus eram dourados(tal como as cúpulas das igrejas de Lord Wellington), mas só douravam para quem entrava no retiro com o coração aberto e a alma pura, os esbirros do soberano e os cobradores de impostos do reino tinham medo das escuridões,dos sortilégios, das velhas árvores negras e dos personagens sisudos (pensavam eles) que por ele circulavam,não se atrevendo a passar além.

Decidido a pôr fim aos largos sorrisos dos seus súbditos manda o Lord matar a feitiçeira,pede a um grande número de homens que se dirijam à floresta de Dartmoor e cortem o dedo de Núria como prova da sua morte,dará por esse feito uma larga recompensa em terras e castelos de nobres caídos em desgraça,era seu hábito matar todos os que se lhe opunham,até mesmo seus pares.

Assim fizeram os seus homens mais valoroso , apesar de grande parte deles ter desertado antes de entrar na floresta. Depois de assassinarem Núria , cortaram-lhe o dedo mas o anel foi cair numa raiz de Mandrágora.

Ao chegarem ao palácio , Lord Wellington atira desdenhosamente o dedo para o jardim , indo ficar num canteiro de flores, pensou ele ter-se livrado definitivamente da feiticeira.

Ainda hoje, o dedo espetado de Núria ,envolto em belas gotas de orvalho , aponta todos os palácio , de todos os Lordes e corruptos , é uma praga magnífica, existente em todos os belos jardins, de todos os reinos, todas as cúpulas douradas, de todas as igrejas e todos os palácios, construídos com suor e os impostos dos pobres, permanecem apontados por um dedo e hoje, ainda ninguém,sabe ao certo, qual foi o segundo feitiço, que Núria rogou, a todos os déspotas deste mundo.

O anel Ficou na raiz da Madrágora,(daí a semelhança com Núria) e continua , a encantar as florestas ainda não devastadas e urbanizadas, uma vez que,os seus gritos , ao ser arrancada à Terra Mãe , em noite de lua cheia , matam qualquer construtor ou condutor de bulldozer que o intente, apesar de todos estes usarem maléficos negros cães , descendentes dos soldados de Lord Wellington que ousaram entrar nas MINHAS florestas encantadas e... Meus domínios.



Transhumante (guardião de paz verde)



Jorge Santos (2008)

o pergaminho de Horus



Horus

Florença, quente e húmido fim de tarde, quase noite, Nas mãos delas, unhas rebeldes em luz fosca de velas, circulava e rodopiavam, dir-se-iam de plantão plantadas em rua vilã ou viela apagada e soturna, as muitas videntes, novas e velhas.
À volta de bolhas de cristais translúcidos, mariposas esvoaçam enquanto sons abafados intangíveis criavam uma atmosfera densa, fragial no ritual das videntes da Florença fim de tarde, sentia-se em casa e avança, por entre aquela multidão que dança em rodas de bruxas, feiticeiras, alguns turistas e carteiristas ítalos, caminha alheio e defronte dele abre-se a porta da catedral renascentista da cidade, convida-o um monge tapado a preceito a entrar, ele olha para trás sobre os ombros ainda o monge não se tivesse enganado e pergunta-lhe sussurrando:
- quem? Io?
O monge baixa ligeiramente a cabeça em sinal afirmativo.
Os passos ecoam na Basílica, o esvoaçar de uma coruja perto do altar e a luz ambígua e pouca que se esgueira pelos vitrais penetram fundo no espírito de Joel, como se aquele segundo tivesse sido congelado para jamais o abandonar e o perseguisse futuramente fosse para onde fosse na demanda mística que se propusera.
Aquele segundo tinha-o visto de soslaio nas auras de cristal da rua das videntes.
Provavelmente Joel nunca sentira calafrio tão intenso percorrer todo o corpo e fixar-se no fundo das costas, entrara numa imensa galeria de estantes com pergaminhos e escritos antigos, um escrito em hebraico chamou-lhe a atenção, o título “
 עינו של אלוהים” (O olho de Deus), exactamente aquele que o monge retirou cuidadosamente e pousou sobre a grande mesa que compunha todo o centro da sala.
Retirou-se lentamente e em silêncio como tinha entrado deixando Joel só na enorme galeria.
Durante o percurso que realizara na Peregrinação a Santiago de Compostela mencionava-o em registos murais e frisos das muitas igrejas mas duvidara da autenticidade do códice, agora tinha-o ali iluminado pela luz vagabunda dos vitrais da catedral.
Símbolos e mais símbolos afluíam aos olhos espantados de Joel, esperava encontrar uma nova definição para a luz e renascia o interesse pelas transcrições que o seu pai anotara décadas antes num velho bloco, só faltava mesmo era dar sentido a todos aqueles gatafunhos.
Abandona a sala muitas horas depois sem ...
Agora o céu era maior, caminhava desde muito cedo num descampado tingido com os primeiros laivos da madrugada, desde que partira há quatro dias de S.Jean Pied de Port , subindo as encostas íngremes dos Pirenéus até aqui a Atapuerca atravessara vários tipos de paisagem, vinhas recém-vindimadas ,Carvalhais anãos ,cidades grandes e lugarejos com apenas algumas casas pobres , encontrava-se finalmente no reino das pedras ,no mais antigo domínio que o homem tinha gerado e também o mais inextinguível, magnífico  senhor das pedras sentia-se ao calcorrear aquele descampado ,para outros simples calhaus mas para Joel tinham um significado bem mais lapidado, os requintes estavam nas pedras milenares desquinadas pelos pés de quem usufruíra do caminho.
 Acossava-o um apetite matinal que o levou a entrar numa taberna a beira da calçada velha, foi servido de pão muito escuros e um copo largo de leite amável pelo sorriso largo de Maria da Luz, (disse-lho detrás do balcão como se fosse o nome mais original do mundo), no olhar encerrava sigilos e os silêncios das sendas, apenas esperara décadas de sorrisos e generosidades servidas com intimidade para revelar finalmente fábulas com pronúncias coincidentes.
O espanto revela-se como numa pedra da roseta nas simbologias que se escondiam nas brochuras amarelecidas, Maria não tinha uma cultura extravasante mas sabia o som dos silêncios e dos sussurros do vento em árvores e caminhares de miles de anos, o mesmo som abafado da rua das videntes de Florença, exactamente os mesmos cheiros e sigilos. Fez-se um silêncio de cera, os conceitos escondidos nos pergaminhos tinham os mesmos prenúncios, dir-se-iam entoados por todas as fecundadas em unanimidade.
Deixou de relacionar os caminhos cruzados nas terras dos “Vera cruz” ou a Itália do renascimento dos senhorios mas com, simplesmente “Maria da Luz”, com o nascimento do Homem perante o Olhar de Deus, a senda da Luz.
Nos apontamentos do pai o triângulo equilátero sediava o suposto olho de horus e a luz expandia-se de um ponto, algures no que lhe parecia um cabo, no fim da terra, mas era uma Luz feminina que ele pressentia, ao contrário de seu pai que sempre julgou ver Deus um homem imaculado em letra Musculada.
  A Cidade de Burgos, sentada no fundo do vale, presenteia-se sóbria, com excepção da Catedral de pedra clara, símbolo da riqueza cultivada nas colinas adjacentes
  O albergue, minúsculo, situava-se no interior duma capela junto ao centro de Burgos, junto à porta já se acotovelavam alguns peregrinos, no interior decorria uma missa, Joel espreitou pela porta entreaberta, aproximou-se e tentou entender o cochichar de dois encapuzados atrás do altar mas estas falas não figuravam nos idiomas que conhecia, de novo o mesmo sentimento de sigilo no vociferado  secreto do sacerdote .
Encimando o púlpito, o mesmo códice, notava-o pelo símbolo cravado em forma de 3 invertido, aparentava os alfarrabios que sem dúvida lhe perseguiam a existência nos últimos anos, no longo caminho desde Jerusalém, passando por Florença e Bruges.
Abismado pelas coincidências deixa-se ficar sentado, pensabundo, no banco do jardim contíguo á enorme catedral, formações de pombos esvoaçam perseguidos por alguns corvos negros que se encarrapitam nos minareis dos altos edifícios causticando com os ralhos os transeuntes alvorecidos e raros daquela manhã dominical.
Poucas porções do seu corpo se encontravam tapadas, a roupa já muito rasgada evidenciava os maus tratos sucessivos infligidos pelas longas caminhadas, pela inclemência do tempo, mas encontrava-se lúcido e sábio como um cão vadio coberto de escaras.
O percurso continuaria por Leon, já mais plano e Samos, (uma outra e mais curta serrania), encontraria porventura as reacções que nestes longos minutos sentados no jardim o pareciam abandonar. Recordou as palavras inesperadas de um monge, em Lhasa transcrevendo um discurso de Budda, proferido sob uma enorme figueira,

Esta, oh monges, é a Nobre Verdade do Caminho que Conduz à Cessação do Sofrimento. Simplesmente este Óctuplo Nobre Caminho; ou seja, directo Entendimento, directo Pensamento, certa Linguagem,certa Acção, Recta Vida, recto Esforço, directa Atenção e certa Concentração.”

“Esta é a Nobre Verdade do Sofrimento. Desta forma, oh monges, com relação a coisas desconhecidas por mim anteriormente, surgiu a visão, surgiu o conhecimento, surgiu a sabedoria e surgiu a luz”

 Joel descortinou simbologias proféticas semelhantes, as mesmas palavras do antigo testamento:

“Depois de ter dito isso, Maria Madalena calou-se, pois até aqui o Salvador  tinha falado. Mas André respondeu e disse aos irmãos:
"Dizei o que tendes para dizer sobre o que ela falou. Eu, de minha parte, não acredito que o Salvador tenha dito isso. Pois esses ensinamentos carregam ideias estranhas sobre a Cessação do sofrimento no êxtase da perpetuação espiritual e física na forma de mulher".
 Pedro respondeu e falou sobre as mesmas coisas. Ele os inquiriu sobre o Salvador:
"Será que ele realmente conversou em particular com uma mulher entregando-lhe os ensinamentos carnais e não abertamente connosco? Devemos mudar de opinião e a ouvirmos?
Joel ficou longamente em silencio depois de ler este escrito:

 Talvez buda e Cristo fossem uma e a mesma entidade, sob os dedos magros do caminhante o manuscrito revelava-se, finalmente a busca insuspeita dava frutos.
Enquanto o percurso Fluía na Jornada desde o Tibete, Monte Sinai, Jerusalém e Mont-Saint-Michel mencionava-se em inscrições murais de muitas culturas e frisos e credos dos muitos e antigos mosteiros e grutas de anacoretas de tantos e diferentes culturas mas não vacilava a autenticidade do descrito no velho bloco de apontamentos.


(continua)

(continua)

Cais ou (Barbearia)

Batel pacato


O meu pai foi sempre um homem pacato,foram poucas as ocasiões em que o vi expressar largas emoções,mas quando se fazia ao rio tudo mudava,com um sorriso nos lábios contava-me todas os contos dos mundos,contos e mundos que herdei dele.

Foram muitos os dias que naveguei por mares profundos sem saír do mesmo lugar,meu pai fundeava o pequeno batel na praia da Comenda,raramente navegava pela baía do Sado,mas inventava historias que me faziam navegar pelas sete-partidas do mundo.

Ansiava a chegada do domingo para ir na velha vespa 125 esverdeada ,estacionar na praia e galgar a borda do pequeno barco,depois era vê-lo,a saír da praia,dizer adeus aos farois desta cidade,à nostalgia do canto das gaivotas citadinas,abraçar grandes e pequenas ondas ,passar por ilhas desertas , atois de areias brancase,pássaros de todas as cores,palmeirais e vulcões.

Naveguei por entre piratas,fui aprisionado como escravo,deportado em galeras fenícias,transportei pedras Nilo acima até altas pirâmides,no Ganges naveguei por entre folhas transportando velas acesas,em nazca criei linhas rectas a perder de vista,guano recolhi em Atacama,pelo Pantanal brasileiro,depois os glaciares tombaram á minha passagem pelos estreitos de Magalhães,Desembarquei também na ilha do Elefante,rumando ao Austral mar,no boreal pesquei bacalhaus gigantes,Alaskas pisei com mokassins de indio,rezei em todas a linguas todos os credos,tudo graças a meu pai que nunca saíu deste rio,o batel jamais foi desamarrado do Cais da Comenda.

Só depois de conhecer todos os mares coloquei os pés em terra e resolvi conhecer as montanhas e serras deste e outros continentes,mas sempre com os olhos cheios da imaginação do meu pai.foi também por ele que resolvi contar os sonhos em frases ,pode ser que os meus filhos lindos e outros filho de outros homens de bateis pacatos continuem a imaginar viagens extraordinárias.



Jorge Santos

http://joel-matos.blogspot.com 

Quero fazer contigo ainda mais primaveras...


"Quero fazer contigo o que a primavera faz com as cerejas"....: 

".... Quando não te doeu acostumar-te a mim, 
À minha alma solitária e selvagem, 
a meu nome que todos afugentam. 

Tantas vezes vimos arder o luzeiro nos beijando os olhos 
e sobre nossas cabeças distorcer-se os crepúsculosem girantes abanos. 
Sobre ti minhas palavras choveram carícias. 
Desde faz tempo amei teu corpo de nácar ensolarado. 
Chego a te crer a dono do universo. 
Te trarei das montanhas flores alegres, copihues,avelãs escuras, e cestas silvestres de beijos. 
Quero fazer contigoo que a primavera faz com as cerejas. 



Na orla da noite

"Na sombra da noite, fachada onde as estrelas imitam luz,
 Nela venho mascarado, única coisa minha igual frente e verso,
Que tomo de corpo e alma e faço parte desse seu vulto denso
Onde eu me perco e de mera sombra me torno num outro e noite dentro também,
 Mas sem sonhos por perto, que não sejam as estrelas paradas em cima de mim
 Nem sou nem mais fui esperado na orla da penumbra sem fim"

Jorge Santos
04/2010

Pra' Sempre


pra'sempre o nosso mundo inquieto 
e"diferente"há-de existir... e bater 
pé no palco d'alguma vivência anterior 
"capaz de derrubar de horror" 
quem é como nós mas não vê amor e fé 
"em tudo o que faz"em tudo, 
"o que sente"nos bons espíritos 
velhos,velhos de adolescentes 
que não cresceram e ficaram 
"pra sempre","pra sempre" 
presos na Terra do Nunca...pra sempre..

. 

Jorge Santos (até sempre)




Faro/Cantábrico

Faro/Cantábrico
Bamboleando por Alentejos Sadinos  e águas salobras depressa o comboio ganhou nas curvas  as planícies verdes e solestícias com destino a Faro ,chegou às previstas 17:30
Foi hora de montar a bicicleta em sentido literal porque a transportou desmontada como mandam as regras e fisicamente também pois foi subindo sempre em direcção A barranco do Velho onde chegou  de noite, tinha de descansar e nada melhor que um alpendre abrigado da chuva miúda e impertinente que caía e caía sem dó, não havia a prevista e habitual escola “antigo regime” mas um centro social serviu o propósito que era simplesmente dormir.
Pelas seis Horas da madrugada  inicia-se o percurso incerto que o levaria até ao outro mar bem mais a norte ,o Cantábrico, lado oposto da Península e a cerca de mil quilómetros de distancia , em outras etapas.
O sol descobria uma esguia silhueta de ciclista que se projectava agora para a esquerda e abrangia toda uma serra silvestre e verde  embora por curto espaço de tempo, o Caldeirão era incandescente e habitualmente seco como um deserto e vermelho como o fogo  que insistia em labaredas e persistia anos e anos a fio esta desertificação, os cheiros agora eram de estevas e humidade fresca, até perto do meio dia e aí já sem a referida sombra.
As cegonhas perderam o nomadismo e nestas terras malditas e ditas sem sombra não trouxeram mais almas nem devolveram as emigradas nem as ninhadas destas trouxeram filhos, ficaram os velhos e doentes mirando horizontes planos sem vivalma.
Era dia dos cravos (2010) mas as revoluções esqueceram-nos , ficaram-se por comemorações vazias de significado ,por todas as localidades onde ainda havia gente e trabalho as autarquias empenhavam-se em  manter  a chama  tardia.
A distancia até aos cem quilómetros pareceu curta, as pernas respondiam á frenética vontade de pedalar, parecia que o destino estava ganho, faltava metade e o acumular de esforço iria tornar-se dilacerante para os músculos ainda recentemente repousados por um inverno assaz longo .
A estrada nacional 2 em mau estado no distrito de Setúbal baixaria a media que teimava manter-se teimosamente nos 22 km hora, depois ainda ficava no caminho uma pequena serra já no fim do percurso, Monfurado estava posta ali mesmo antes do final desta etapa em Montemor-o-novo e parecia um interminável obstáculo.
Chegando ao termino e esticar-se na relva do pequeno jardim à entrada de Montemor avalia o que já fizera em termos Peninsulares, desde a tentativa de atravessar os Pirenéus do Atlântico ao Mediterrâneo no mais curto espaço de tempo ou seja 14 dias (faltavam-lhe 10 dias), O caminho de Santiago Francês em sete dias (faltavam três dias para finalizar), planeia a continuação até Chaves e ao Cantábrico mas não sem duvidar um pouco da sua boa sanidade mental que o levava e ele e ao corpo até ao limite, sem razão ou recompensa aparente que não fosse aquele sentimento de “dever”cumprido,mas qual dever? deveria isso a ele próprio ?(por egoísmo) ou sentia-se na obrigação de superar todos os outros “eus”que o afligiam e diziam ser impossível,contrariava toda a família e até os músculos, a solidão , o medo que sentia e tentava enfrentar, restava-lhe saber -em prol de quê ? E porquê!? Talvez nunca obtivesse resposta a esta pergunta,
Entretanto estava de regresso a casa, á família, ao conforto e ao trabalho, rendido momentaneamente, mas não vencido, as serras, os caminhos, os trilhos e as paisagens, as falésias de cortar o fôlego ainda esperariam e seriam suas e ele faria parte delas e ele sonharia de novo e sempre o sonho de ser parte da natureza e partilhar o mesmo ar que esta respira
O destino dele era ser Transhumante
Jorge Santos / Transhumante
Abril 2010