Terra á vista



Uma tábua do veleiro "Tarou" 
Partiu-se e naufragou no Rio ,
foi em Mês DE Janeiro Impassível,
o mar era rijo,
e o espanhol "malfeito" 
que era  contramestre , 
mandou pregar o traquete no garupes ,
a jorna faltava e o rancho estava rançoso,
marujos sem pão rabujam,
amofinam-se e amotinam-se no convés 
como convém ao corsário corso ,
sobe o lais no mastro e a mezena panda inflada ,
ordena o contramestre coxo que o amotinado MARIJO 
seja posto no mais alto mastro que no barco haja 
,mas não é que o marijo chegando a verga mestra grita 
esfregando o olho cego porque do outro nada via,
"Terra à Vista"



Jorge Santos

Juntei dobras



Jantei sombras de sol,
Bebi de lua , metamorfoses,
Repousei em negros fortes
De castelos , sem lençol
De fantômas ,dormi d'vela,
Velei dragões , drenei serões,
Bebi de todas as taças,
Paixões e ressacas,
Juntei , as todas,
No és-de-luz-feita,
Que me doura.



Jorge Santos

Teima

Teima , teima,
Naperon na mesa,
Torce o tema,
Vinte lobos de fresa,
Nem por isso infonema,
Teima até ao umbigo,
Jantemos de vela acesa,
Serás o meu castigo,
Mas teima , ate ao pescoço,
Como quem me t'ama
E num esforço t'beija tesa
Teima como amêjoa
Flor e cereja
Teima em geleia
No chão palco vão
Na galeria e na banheira
Teima á minha beira
Na minha Escuna d'vela
Na branca esteira
D'ondas grossas
E neste planeta louco
Teima um pouco


Jorge Santos

O "Da chave"


Sou do D'avido o Ferreiro
Que amanheço cedo neste
Prurido desconhecido
De quem não conheço
Sou o da chave fechado
E o do escadote caído
Se ser assim dividido
No que esta-de-certo
Versos do só-dá-medo
Sou eu delfim vaqueiro
D'enredo e folhetim
Capim e sargaço ,vespeiro,
De capa-e-s'pada assino.
Sou vizinho do tanoeiro
E Jorge Santos a temp'inteiro


Jorge Santos

Maré Mingua



De beira e de pão,
De hasa ferida,
Nariz no chão
Saem-me da lingua
Palavras sem guarida,
Sendo,são o meu quinhão
Sinto, da sina lida
Mais do que tenciono
De cor ,nada
Mas de f'rida
Tombo








O nome ver-te ,em cor d'irada


Nas paredes sorridas ,pintadas
Seria verde cor'de s'trada
D'ela quasi saí ,prostrado
Dum mote todo amantamado
Numa noite ,ela queria ver-te,
N'outra ,nada,nada.






Jorge Santos

Urubu

Inspiração


Expiração


Inspiração


Tenho s’critos nas paredes,
Inúmeros versos, não meus,
Nem m’importo dos dramas,
Serem pequenos, nem das lendas,
Serem d’outros, em mentiras
Obscenas e promessas tidas.


Nã’m’importo, s’o poema
For’o meu, só o direi, apenas
Se for plagio, mudo de tema 
E s’esganar, d’agoiros teimo 
E istmos, às avessas , controversos,
Feitos de nadas e vulgos.


Se persigo, no estalar dos dedos,
As siglas, que me revelam,
Lisas, lisas como penedos,
Não de segredos se m’impregnam
E coabito nos regos d’ouvidos,
No fisgo, no nó da garganta.


Se mudo de opinião, no despojo
M’amocho sem tesão , coaxo e finjo, 
Como rã no pântano , debaixo do junco
E no fosso malcheiroso, nas brumas
On’dantes jazia discreto e branco,
Eu venho de lá , no truz-truz d'luz q’aspiro.


Jorge Santos

Manhã submersa em Ais



O corvo







Numa noite de lendas bravias,
Estudava eu devoções velhas,
Batem leve, leve nos vidrais.
Quem será? Pensei, me visitará?
E que toques  tais, tão gentis,
Só isso; e nada mais?

Era Dezembro,Se bem m'lembro 
Jazia  morno,o frio negro, 
Pela  lareira apagada,
Escrevia com morrão ,Leonor,
Para não te esquecer,na dor,
Mas sem nome,aqui jamais.

A mim mesmo acudi, no medo,
Abri de breve o cortinado,
Repetia em desassossego, 
Mais isso que de meu medo
-É um visitante atrasado,
É só isto, sim e nada mais

Já sem tardo e não hesito,
Abro, par em par meus vitrais
Se, Senhor; senhora, mal me sinto,
Eu, dormindo e vós, batendo,
Mal ouvi; abri largos portais,
Noite, noite e nada mais.

Fitei perplexo, receado,
Noite d’amplexo, silêncio,
E  ais,no eco repetido.
O nome dela, vi, no vazio
Desta paz profana. E maldigo,
Isso , só , e nada mais.

Não tarda e ouço,novo som,
Em minh’alma ardendo mais
E vou ver o que está nela,
Por que me distrem com sinais,
Soltos e sempre neste triste tom,
“É o vento, e nada mais.”


Entrou grave e nobre  corvo,
Digno dos contos medievais,
Pousou lento  no busto, alvo,
D’atena,nestes meus umbrais,
Não me fez qualquer cumprimento,
Foi, pousou, e nada mais.


“Tens todo aspecto tosquiado”
Ò ave, migrada dos  infernos,
Diz-me o teu nome,danado,
D’alto desses  teus rituais,
com mais de mil e um séculos,
Disse o corvo, “Nunca mais”.

Fiquei pasmado  d’ouvir falar,
Inda que pouco clara ,esta’ ve 
Rara pousada no busto,grave
E preto ,no alvo alabastro,
Ave e bicho, d’alarve olhar
Com o nome “Nunca mais”.

Mas o corvo ficou calado
Augusto e empoleirado.
Perdido,eu murumrei  lento,
“Amigos, sonhos – mortais Todos–
Todos  foram. Amanhã  te’vais”
Disse o corvo, “Nunca mais”.

Que frase tão sabida esta,
Por ser voz  usual , aprendida,
Ou d’ algum don,desgraçada vida
Em tom  se quebrou nesta porta
De seu canto cheio d’ais 
Era este “Nunca mais”.

Mas troçando da vil amargura
Sentei pois defronte dela
E Enterrado na cadeira
Pensei nos agoiros dela
Em gritos de tempos ancestrais
Como aquele “Nunca mais”.

Pensava nisto,olhando frente
A frente a ave ,olhos cravados
Na minh’alma,manta de retalhos
De luzes vestutas, em veludos,
Neles Punha sombras in’ iguais
E Reclinar-se-á nunca mais!

Fez-se o ar denso,como incenso

Vozes Clandestinas


Estas vozes clandestinas,
Em tiras finas ,
em laivos de cifras,
Pisando urtigas e fadigas ,
que não calo,
Não quero calar,
não paro de nelas morar.
Estas vozes clandestinas,
Casas caiadas de mapas
e continentes que não calo,
Mexem quando falo e crescem ,
Estas vozes clandestinas,
Que racham , de maneira grave ,
 a madeira do tecto do meu desaguo , no rio decifrado,
É meu paradeiro de taberna ,
De desordeiro ,
arcabouço grosso e tosco , quando grosso,
Mestiço ,clandestino de poço Mouro.
Estas vozes clandestinas ,
Que simulo em pensamentos,
Não são minhas quando as calo ,
Sinto-as dentro ,
quando ditas aos orvalhos,
Das manhãs  despertas e aos talismãs
Que m'emprestam ,
são finas e espíritas ,
 belas e ditas ,assim , deveras,
Quando moro nelas,
e me revelam as cifras d'elas,
Estas vozes franzinas como luzes de velas,
Estas cifras.

Jorge santos

Somos Cem ,mais um


Comigo somos cem,
Cem mil manifestos em Abril,
Comigo somos cem,
Cem milhões de tufões,
Cem picantes temperos ,
Cem revoluções sem medos,
Comigo os canhões são meros brinquedos,
Os torpedos são feijões,
Os penedos ,  diversões,
Comigo somos cem,
Cem colunas do templo de dyana,
Cem rugas no ventre da mãe,
No tempo em que geramos,
Gentes sem opiniões,
Somos todos e somos poucos,
Mas comigo somos cem,
Mil milhões,
De loucos ,mais um.


Jorge Santos

Sillêncios


Para ouvir a voz do silêncio,
pus-me a gritar aos quatro ventos,
o nome que me dizias baixo ao ouvido,
para ouvir o sopro do vento , encostei o ouvido ao vulcão,
e saiu de dentro , a voz do tempo,
e a tua que sussurrava,
mas não ouvi,
a tua morada,
então pus-me a gritar,
do Vesúvio , em desespero de causa,
e as asas do condor , transportaram a minha voz gritada,
aos cumes negados dos Andes,
e ,onde antes era silêncio,
ecoou , por montes e vales , o teu nome,
depois fez-se noite,
imersa e silenciosa.

Joel Matos

Se fosse eu

e fosse greve seria breve ,
se fosse meu,
seria réu ,
da fome e da greve de fome,
se fosse meu
o respirar e da inspiração, servo
, seria breve e Suevo,
 o ar seria gota leve
,a Terra dura me saberia a doce e a presente
e seria agua de Jo,
seria livre artilheiro
de guerras profanas
e o mundo seria perfeito
o limoeiro daria limões amarelos
e a Cidreira douraria de Chás
,a Videira se cobriria
prenhe de pão de Ló.

.Da gota leve sorvo
o acido e Plácido respingo
,ate Domingo ,
até seu cheiro permanecer
no beijo de milho louro
,que não seja greve
que seja meu e eu seja
réu da fome e seja eu Jo,
se não ,que seja pó de arroz ,
no teu rosto e a tua voz cristal de neve.

Jorge Santos

Verde

Estátuas e guaritas,estradas infinitas,dizei-me,
Dizei-me se na minha vida tudo é verde,
Se é verde a vida ,se é verde a s'trada que garimpo,
Se é verde o vinho , que sobeja na taça e a taça que verto , também é verde.

Se ver-te verde , azul ou vermelho é miopia,
Dizei-me estátuas garridas , lages e avenidas,torres,
Se vejo verdes , guaritas e torrões castanhos,torreões , castelos,
Quando verdes seriam teus olhos claros,e cabelos.
Verdes são meus sonhos guardados,verdes são minhas mãos,
Verdes os meus sonhos,verde , minha pele escamosa.

Verdes as minhas princesas à espreita,
Não têm olhos verdes nem castanhos ,são olhos
De todos os tamanhos ,seguem-me nos sub terminais,
No metro suburbano, nos subterrâneos ,nas masmorras,
Dizei-me princesas se verdes são meus olhos,
Escamosa minha pele e ventosas

 Jorge Santos

Finjo que Fujo



Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo,Não, Eu simplesmente sinto Com a imaginação,
Não uso o coração , não lamento o que não escrevo,
Nem sinto flores demais sair desta mão,
Desta raiva do não sentir, mais infiel no dizer que a mim,
Dizem que finjo ou minto no que risco,
Ou imito ,mas sinto um resto , de purpura seda,
Que me cobre a razão
E , pelo sim ,  pelo não,
Escrevo no correr da mão.

Jorge Santos

Sei

Sei que posso
passar por Aí e
 levar um amigo,
 um abraço
 pendurado no pescoço e no braço
não é obrigatório  gostar de poesia ,
mas ela está sempre presente ,
eu sei ,
sei que posso passar por Aí,
levar comigo o  mais simples gesto ou palavra
que possuir, a pretexto de tudo e de nada,
ela pode ser desfraldada
como bandeira
ou arreada na haste da derrota
mas eu sei
que a podes levar contigo
e a posso  trazer comigo,
no bolso,
 por mais simples que seja ,
vale o esforço.
eu sei ,
eu sei que a palavra não é nossa
nem é gaga é nao é nada
se não for dada
e se não for verdade/mensagem ,
se não for leve
e ao mesmo tempo pesada.


Jorge Santos